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BOLSONARO E O CENTRÃO: O FIM DO CASAMENTO ESTÁ PRÓXIMO?

Atualizado: 6 de jul. de 2021

Escrevi em 04 de fevereiro nesse mesmo espaço[1] que o casamento entre o Centrão e Bolsonaro, celebrado por ocasião da eleição do Presidente da Câmara, Arthur Lira, tinha data para acabar. Transcrevo um trecho desse artigo, por ilustrativo:

Bolsonaro já provou que de bobo não tem nada. Ele pode ser bronco, ignorante, racista, homofóbico e violento, mas não é burro. Bolsonaro sabe que esse acordo tem data para acabar e essa data passa pela primeira denúncia de corrupção que houver no governo. Com o loteamento de cargos que começa agora a ser feito com o Centrão, cuja fama não é, nem nunca foi, de ética na política, isso não vai demorar muito.

Pois bem, o dia do fim – ou, ao menos, o seu prenúncio – desse casamento chegou: foi sexta-feira, dia 25/06, com o depoimento na CPI da Covid, no Senado Federal, do servidor do Ministério da Saúde, Luiz Ricardo Miranda e do seu irmão, o deputado federal, Luiz Miranda, do DEM/DF, sobre a pressão que os superiores desse servidor fizeram para que este assinasse uma invoice – fatura –, no valor de 45 milhões de dólares a favor de um empresa localizada no paraíso fiscal de Singapura, em desacordo com o termos do contrato celebrado com a empresa Precisa Medicamentos e o Ministério da Saúde, no valor de R$ 1,6 bi, para fornecimento da vacina Covaxin, do laboratório indiano Bharat/Biotech, ao Brasil.

Por ocasião do seu depoimento, o deputado, visivelmente nervoso, deixou escapar uma informação que, politicamente, é uma bomba para o governo: a de que, quando da visita que fizeram, ele e seu irmão, ao Presidente da República, em 20/03, para levar-lhe a informação da suspeita de corrupção que estava ocorrendo no Ministério da Saúde, este teria comentado, no seu estilo inconfundível, de que essa “porra” seria coisa do Deputado Ricardo Barros, PP/PR e que ele, Presidente, se fosse mexer nisso ia dar “merda”.

Ricardo Barros, para quem não sabe, além de ser integrante de um partido que faz parte do Centrão é, nada mais, nada menos, do que líder do governo na Câmara Federal!

Com a inércia do Presidente em mandar apurar a denúncia e o avanço dos trabalhos da CPI, o caso venho a público na última sexta feira, expondo o telhado de vidro desse governo em dois flancos: no da desculpa até então usada pelo governo para a demora na aquisição da vacina da Pfizer e no discurso do combate à corrupção, dado que o preço oferecido na ocasião pela Pfizer – US$ 10 a dose - é 50% inferior ao da Covaxin, o qual estava sendo negociado por US$ 15 a dose. Imunizante esse sequer aprovado pela Anvisa. Não obstante, tais fatos não foram considerados obstáculos pelos agentes do Ministério da Saúde envolvidos no caso para exercer pressão inusitada sobre o servidor que se negava a assinar a fatura de US$ 45 milhões, para pagamento antecipado – antes da entrega da doses - a um empresa que sequer constava do contrato, sediada num paraíso fiscal.

Agora, com a implicação do líder do Governo no caso – o qual será chamado à CPI para prestar esclarecimentos e, claro, terá esta, em nome do devido processo legal, ainda de provar o seu envolvimento – Bolsonaro vê-se em palpos de aranha, pois de um lado precisa do Centrão para barrar os mais de cem pedidos de impeachment protocolados na Câmara Federal e de outro, não quererá perder um dos pilares do seu governo, cuja bandeira foi um dos carros-chefes da sua eleição: a do combate à corrupção.

Em fevereiro, quando escrevi o artigo acima mencionado, a aproximação do Bolsonaro do Centrão dava-se no contexto do avanço das apurações do envolvimento de Flávio Bolsonaro, o filho 01 do Presidente, no esquema da rachadinha da ALERJ. O operador do esquema, seu ex-assessor, Fabrício Queiroz, recém havia sido preso, encontrado que fora na casa de Frederick Wassef, ninguém menos que um dos advogados da família Bolsonaro. Esse fato, fragilizou o Presidente, fazendo com o que inquérito das Fake News e dos atos antidemocráticos, no STF, pudesse avançar sobre a militância mais radical do Presidente da República, quando foi desmontado o acampamento dos 300, localizado em plena Esplanada dos Ministérios e declarada a prisão de Sara Winter, uma das mais engajadas líderes desse bando no enfrentamento das instituições democráticas. Para evitar, eventual avanço de um dos mais de 60 pedidos de impeachment já protocolados naquela altura na Câmara Federal, Bolsonaro finalmente cede, e se aproxima do Centrão. Patrocina a eleição do Presidente da Câmara e do Senado Federal, conseguindo emplacar os dois.

Ocorre que essa aproximação do Presidente do Centrão não foi bem vista por grande parte dos seus apoiadores, eis que essa aproximação reinaugurou aquilo que eles pretendiam ver varrido da administração federal com a eleição de Bolsonaro, qual seja, o presidencialismo de coalização, dado que foi esse tipo de governo que propiciou que a corrupção grassasse nos governos de Fernando Henrique até o do golpista Michel Temer, passando pelos 3 governos do PT.

Escrevi, então, na ocasião:

Ao tentar (Bolsonaro) se descolar do Centrão, como sempre faz quando os odores da corrupção começam a cercá-lo – foi assim com o laranjal do PSL, Bebbiano, Bivar e outros aliados, mesmo os de primeira hora – Bolsonaro poderá ser emparedado pelo Centrão – este, ao menos, vai tentar. Será o pretexto perfeito para Bolsonaro denunciar o acordo que fez com o bloco, vitimizando-se perante a opinião pública, sobretudo entre seus apoiadores, alegando que com esse Congresso não dá pra governar, que é a velha política tentando frustrar seu projeto de governo – cujo teor ninguém sabe até hoje qual seja, se não a de governar como um autocrata - arregimentando de novo suas milícias contra o Congresso e o STF.

É sempre difícil fazer previsões sobre o que irá acontecer com o governo Bolsonaro após as revelações do envolvimento do seu líder do governo nesse esquema e a própria omissão do Presidente em mandar apurar as denúncias recebidas, o que pode caracterizar o crime de prevaricação.

Quando fazemos previsões, elas são baseadas na foto do momento e no histórico dos fatos e das personagens envolvidas. Quando escrevi, em fevereiro, o artigo acima citado, Bolsonaro ainda podia contar com alguma reserva moral e uma base de apoio mais ampla na sociedade. Hoje, com o desastre que foi sua gestão sobre a pandemia, mais de meio milhão de mortos pela Covid-19 e as denúncias, agora, envolvendo justamente o Ministério que devia ter dado um combate mais eficiente e efetivo à doença, Bolsonaro dificilmente conseguirá deixar o Centrão para evitar que colem em seu governo a pecha de corrupto. É provável que, como costuma acontecer no Brasil, nesse primeiro momento, busque-se uma solução de consenso e algumas cabeças sejam entregues. Ricardo Barros poderá ser rifado pelo Centrão para este se manter no governo e Pazuello, a quem, alega o governo, foi encaminhado a denúncia, como bom soldado que é, poderá tentar dominar mais essa para deixar a bola redonda de novo para Bolsonaro.

O fato é que as apurações da CPI devem continuar avançando, ocupando a pauta da mídia, fazendo com que esse governo sangre ainda mais, até perder significativo apoio nas ruas. Com o avanço da vacinação, as manifestações que já vinham ganhando corpo, agora, com as revelações dessa semana, tenderão a crescer e, sabe-se, que as ruas quando começam a encher, é um movimento que ninguém consegue deter.

Esse fato poderá fazer o Centrão desembarcar do governo? É o que iremos observar nos próximos dias, pois esse bloco parlamentar é movido pelos interesses políticos e quando estes se revelarem mais danosos que os benefícios de permanecer no governo, o casamento entre Bolsonaro e Centrão poderá se encaminhar para o fim, abrindo o caminho para o impeachment.

É o que sempre acaba acontecendo com aqueles que menosprezam a política para governar: caem pelas mãos daqueles que desprezam.

Foi assim com Collor, quando confiou mais em seu “negócio roxo” do que no Congresso. Com Dilma, quando perdeu o comando da Casa Parlamentar por obra e graça do notório corrupto Eduardo Cunha, já condenado em dois processos por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e outros crimes. E, agora, com Bolsonaro, quando no auge da sua popularidade, preferiu surfar em aventuras golpistas do que fazer um governo minimamente sensato no enfrentamento da Covid-19: vacinação em massa, auxílio emergencial decente para a população, crédito efetivamente facilitado para as microempresas, coordenação nacional do enfrentamento da doença, campanhas publicitárias de conscientização da população sobre a gravidade da doença e da importância dos cuidados preventivos.

Agora, com a popularidade em queda, não terá forças para se manter no poder sem o apoio incômodo do Centrão, justamente de onde poderá vir a sua derrocada.

[1] https://www.julioperezescritor.com/post/bolsonaro-e-centr%C3%A3o-casamento-de-conveni%C3%AAncia-com-data-para-acabar

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